sábado, 15 de outubro de 2011

O Cálculo
Uma realista e direta mensagem de Jesus para a igreja


Felippe Amorim

Professor de história no IAENE e aluno do 6º período do SALT-IAENE

Vinícius Mendes

Professor de Português no IAENE, mestrando em Ciências Sociais pela UFRB e Formando em Teologia no SALT-IAENE



Introdução:

            A obra mais famosa do arquiteto catalão AntoniGaudí é a igreja da Sagrada Família, em Barcelona, um castelo que tem a peculiar característica de parecer ser feito de areia, com torres prestes a desmoronar a qualquer momento. Iniciada em 19 de março de 1882, esta fantástica obra teve que ser interrompida pela morte do seu arquiteto: Gaudí morreu atropelado por um bonde em 1926 antes de poder finalizá-la.
Seu corpo foi enterrado na cripta da igreja, que possui também um museu em que estão maquetes que mostram como o arquiteto/artista imaginava o local. E a obra permanece inacabada até hoje, eternamente em construção, e muitos afirmam que ela nunca será terminada. Esta, sem duvida, é uma das atrações daquele lugar.
Alguns críticos dizem que uma possível versão final do edifício de Gaudi vai parecer muito pouco com o projeto original. Gaudí se recusou a desenhar todo o projeto durante a construção e preferiu fazer alterações com a obra em andamento. Os desenhos originais, durante a Guerra Civil espanhola, foram muito estragados pelos anarquistas. Gaudí passou 40 anos supervisionando o trabalho no edifício, e quando morreu, em 1926, a igreja estava longe de terminar.
Quando vamos realizar uma obra, grande ou pequena, para que tenhamos sucesso, precisamos calcular o que necessitaremos para a sua conclusão em tempo hábil. Quando não damos este passo corremos o risco de repetir o que aconteceu com a basílica da sagrada família em Barcelona: uma grande obra que não pode ser concluída.

A vida cristã pode ser comparada a uma obra que está sendo construída. Sendo assim necessitamos fazer os cálculos para avaliarmos o que precisaremos para avançar. Jesus falou sobre o cálculo para a vida cristã em Lucas 14:25-33. Em seguida vamos analisar este trecho das escrituras.


O realismo de Jesus
           
            O texto começa assim: “Ora, iam com ele(Jesus) grandes multidões; e, voltando-se, disse-lhes: (v. 25)”.  Muitos pregadores se impressionam quando multidões param para ouvi-lo. Às vezes nós mesmos medimos o sucesso de uma igreja pela quantidade de pessoas que estão frequentando as reuniões, mas com Jesus é diferente.
            Neste episódio uma multidão o seguia, mas Cristo parou e virou-se para ela. Certamente não virou para alimentar a vaidade de ser seguido por muitos, tampouco queria conferir se alguém tinha sido acrescentado à multidão. O que ele queria era alertar àquelas pessoas que o caminho que estavam tomando exigiria delas renúncias e por isso elas deviam avaliar se valeria a pena.
            Muitos naquela multidão seguiam a Jesus por motivos errados: popularidade, benefícios físicos, emocionais e sociais. Hoje não é diferente. Ser um cristão em nossa sociedade é motivo de elogios, os cristãos tem uma vida social bastante satisfatória proporcionada pela convivência com os irmãos na igreja. Há vantagens em ser um cristão, mas não é por isso que devemos seguir a Jesus. No momento em que se virou para a multidão Jesus queria alertá-la a respeito do preço de sua decisão.

            O preço da caminhada

Ao olhar para aquelas pessoas Jesus com o coração cheio de amor fala algo que precisamos compreender bem: “Se alguém vier a mim, e não aborrecer a pai e mãe, a mulher e filhos, a irmãos e irmãs, e ainda também à própria vida, não pode ser meu discípulo. Quem não leva a sua cruz e não me segue, não pode ser meu discípulo (v. 26,27)”.
            Primeiro precisamos entender o sentido da palavra aborrecer, para que não pensemos que Jesus estava desprezando uma instituição que ele mesmo criou: a família. Quando o Senhor proferiu esta palavra ela tinha o sentido de “Amar menos”. Na verdade a frase de Cristo reforçou o valor da família. Em outras palavras Ele disse: a família é algo muito importante, porém, mesmo ela não pode ser mais importante do que Deus.
            Jesus usou o exemplo máximo para que nós entendêssemos os menores. Se a família, sendo tão importante, não pode estar acima de Cristo, imagine, por exemplo,um emprego que não lhe proporcione oportunidade de guardar o sábado, ou quem sabe um namoro fora dos princípios bíblicos. Podemos aplicar esse conceito também às amizades, aos divertimentos entre outras coisas. Nada pode ser mais importante que Jesus.
O Salvador, portanto, estava falando sobre prioridades. Ele estava querendo nos dizer que as nossas tradições familiares, a opinião do nosso cônjuge, de nossos pais ouqualquer outra questão familiar não pode ser mais importante para nós do que a vontade de Deus.
Jesus vai mais fundo no texto falando em aborrecer à própria vida. Neste momento ele se refere à caminhada cristã. O evangelho de Lucas é uma narrativa da viagem de Cristo em direção à Jerusalém. Neste contexto Cristo estava dizendo àquelas pessoas da multidão: “vocês estão me seguindo, mas devem saber que o final da minha caminhada é a cruz, ou seja, a morte. Querem continuar?”
Sem dúvida isso é uma metáfora da vida cristã, que é uma caminhada para a morte espiritual. O apóstolo Paulo compreendia bem isso quando disse: “Pois eu pela lei morri para a lei, a fim de viver para Deus. Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé no filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim(Gl 2:19,20).
A Bíblia nunca nos escondeu os desafios da vida cristã e é vontade de Deus que calculemos todas as implicações de escolhermos este caminho para nós. Por isso que Jesus foi tão enfático: se não tomar a cruz NÃO PODE ser discípulo.

O Cálculo

            Jesus é o maior professor que já existiu e para ensinar aquela lição Ele deu dois exemplos: “Pois qual de vós, querendo edificar uma torre, não se senta primeiro a calcular as despesas, para ver se tem com que a acabar? Para não acontecer que, depois de haver posto os alicerces, e não a podendo acabar, todos os que a virem comecem a zombar dele,dizendo: Este homem começou a edificar e não pode acabar.Ou qual é o rei que, indo entrar em guerra contra outro rei, não se senta primeiro a consultar se com dez mil pode sair ao encontro do que vem contra ele com vinte mil? No caso contrário, enquanto o outro ainda está longe, manda embaixadores, e pede condições de paz”(v. 28-32).
            Estes exemplos podem ser resumidos em uma frase: “Querer não é poder”. Neles nos foi mostrado que para seguir Jesus é preciso mais do que vontade. Os dois homens tinham vontade de realizar seu empreendimento, mas não calcularam os custos da obra, ou seja, não sabiam que não tinham condições logísticas de executar aquilo que desejavam.
            Outro requisito básico para ser um discípulo é ter ciência de que há um preço. Todo este discurso de Cristo nos alerta a respeito do preço de segui-lO. Muitas pessoas querem ser cristãs, mas não estão dispostas a pagar o preço, que pode ser traduzido em renúncias profundas. Em outras palavras, não dá para ser cristão e aproveitar o mundo ao mesmo tempo. Por isso Jesus deu o exemplo do cálculo. Quem seguir sem calcular as renúncias que necessita fazer não chegará ao final da caminhada e acabará envergonhado.
Para entendermos melhor, vamos ilustrar: Imagine que um namorado convide sua namorada para visitar um ponto turístico na cidade vizinha e deseja tomar um sorvete naquela cidade. O dinheiro que ele tem, no entanto, dá apenas para pagar a passagem de ida e volta de ônibus, não sobrando o suficiente para o sorvete. Eles então vão, lá decidem tomar o sorvete e na hora de voltar descobrem o que um simples cálculo prévio esclareceria: ele não tem dinheiro suficiente para pagar as passagens de volta. Que vergonha para o namorado!
Este exemplo nos ajuda a entender o conceito que Jesus gostaria de passar. Não dá para servir a Deus e continuar com as coisas do mundo. Há um preço para a vida cristã, o qual se configura em renunciar aquilo que não tem coerência com a caminhada para o céu.
Há outra coisa que podemos perceber neste trecho das escrituras:Jesus não mendiga nosso discipulado. Quando Ele se virou para a multidão queria deixar claro que aqueles que não estivessem dispostos a renunciar os prazeres transitórios do pecado não teriam a mínima condição de continuar a caminhada cristã.
É muito comum no mundo evangélico atual ouvirmos pregadores apresentando um Cristo que se oferece para as pessoas por qualquer preço. Oferecendo uma graça barata. Esse não é o Cristo bíblico.
É útil salientarmos que embora tenhamos que pagar um preço para seguir Jesus, não é esse o preço que paga a nossa salvação. Trata-se, na verdade, de uma implicação natural da aceitação da salvação divina.O discípulo verdadeiro entende o tamanho do presente que recebeu de Cristo e, em gratidão,está disposto a pagar o preço de seguir a Jesus.
No último verso do trecho que estamos analisando,Jesus arremata o que estava dizendo com uma afirmação bastante realista: “Assim, pois, todo aquele dentre vós que não renuncia a tudo quanto possui, não pode ser meu discípulo”(Lc. 14:33). Você percebeu a expressão “Não pode” de Cristo? Ele está dizendo que mesmo que queira seguir Jesus, o cristão que se apega a este mundo não pode segui-lo. Em outras palavras: “você não tem condições de me seguir enquanto continuar amando o que ama, valorizando o que valoriza.”
Sinceramente, quando ouvi Jesus dizer isso para mim, através da leitura devocional dessa passagem de Lucas, me senti impotente, sem a mínima condição de prosseguir na caminhada cristã. Fiz o cálculo e percebi que não tenho a mínima chance de continuar por mim mesmo. Era como se Jesus estivesse dizendo para mim: “soldado, pede pra sair”. Então, tomei uma decisão: caí de joelhos e clamei a Deus para que Ele me desse o poder para continuar a caminhada, dizendo para Ele: “afinal de contas, foi o Senhor que me chamou para essa jornada. Não pode simplesmente agora dizer que estou fora. Lutei com Ele como Jacó e supliquei que não fosse abandonado sem o poder necessário para prosseguir. Tal como Pedro, reconheci: “Para onde irei, pois só tu tens as palavras da vida eterna”(Jo. 6:68). Entendi, então, qual era o objetivo de Jesus ao me dizer palavras tão diretas e realistas: Ele mais uma vez queria que eu entendesse minha total dependência dEle e buscasse nEle o poder para continuar. Graça maravilhosa!
Nos últimos dias da igreja de Cristo neste planeta haverá três classes de pessoas: Os que farão o cálculo da vida cristã e decidirão sair, os que não farão o cálculo e “ficarão” por algum tempo até saírem envergonhados e os que farão o cálculo, perceberão que não podem por si mesmos e pedirão o poder de Deus para prosseguir. Hoje é o dia de pedirmos o poder de Deus para carregarmos nossa cruz e sermos verdadeiros discípulos de Cristo.