A nossa leve e momentânea tribulação
Felippe Amorim
Certamente Deus é bom para Israel, para os puros de coração. Quanto a mim, os meus pés quase tropeçaram; por pouco não escorreguei. (Salmo 73:1-2 NVI)
Introdução
A vida cristã é composta por diversos desafios, alguns grandes outros pequenos, alguns fáceis de serem compreendidos, outros nem tanto. Um dos grandes desafios para o cristão é ver que ao seu redor existem pessoas que não temem a Deus, que transgridem Sua lei, que não preocupam-se em manter uma vida de comunhão com o criador, mas, apesar de tudo isso, são aparentemente felizes, prósperos, desfrutam de uma tranquilidade que muitas vezes é rara de se ver na vida daqueles que procuram estar sempre perto de Jesus.
Para o fiel cristão esta ausência de compreensão pode ser refletida em um considerável abalo de sua estabilidade espiritual e, se o ser humano não estiver firme em Deus, pode até ser levado à queda espiritual. É preciso que tenhamos uma verdadeira noção do que está por trás de cada uma dessas situações. Como entender, então, a prosperidade dos ímpios e a aparente infelicidades dos justos? Podemos esclarecer este assunto estudando a mensagem do Salmo 73.
Os sentimentos do salmista
A primeira afirmação que é feita neste salmo diz respeito à bondade de Deus. Apesar de todo o conflito pelo qual o salmista passou, ele começa o seu texto contudentemente afirmando que Deus é bom. Partindo desse pressuposto, administrar as aflições da vida fica muito mais simples. Não é demais lembrar que o versículo um diz para quem Deus certamente é bom: “para os puros de coração”.
Apesar de toda esta certeza que habitava no coração do autor, ele vivia um conflito em sua mente e coração. Asafe, o autor do salmo, teve inveja dos ímpios. Ele apresenta uma série de motivos para que este mal sentimento tenha brotado em seu coração.
O primeiro motivo apresentado pelo salmista é a prosperidade dos ímpíos (v.3). Ao observar a vida, aparentemente, próspera daqueles que nada queriam com Deus um sentimento de inveja surgiu no coração de Asafe. Além disso estes ímpios eram orgulhosos por causa de suas riquezas.
A atitude do poeta bíblico é muito compreensiva, quem já não se perguntou a causa de um vizinho incrédulo ser tão prospero em seu trabalho, enquanto o piedoso crente tem tantas lutas para alimentar os seus. Parece que para o ímpios a vida é muito mais fácil.
Outro motivo apresentado para a inveja que o salmista sentia era a tranquilidade com a qual os perversos levavam a vida (v.4). A versão Bíblica NVI traduziu assim: “Eles não passam por sofrimentos”. Neste versículo ainda tem uma outra razão para a inveja de Asafe: Eles “tem o corpo saudável e Forte”(NVI).
Certa vez ouvi o relato de um amigo que me dizia como ficou chateado quando uma determinada pessoa fez uma crítica que o feriu muito, desconsiderando os aspectos genéticos a pessoa disse: “seu pai foi vegetariano a vida toda e morreu de câncer”. As vezes nos deparamos com situações como esta. Pessoas que optam por seguir as claras orientações de Deus quanto a alimentação saudável são acometidas por doenças horríveis, enquanto pessoas que maltratam seu corpo com maus hábitos alimentares tem uma saúde aparentemente de ferro. Como entender? Asafe ficou muito perturbado.
O texto do salmo 73 ainda afirma que os ímpios não tem aflições e este era outro motivo pelo qual a inveja nasceu no coração do salmista.
Quando observamos o texto de Asafe, facilmente notamos a inquietação do escritor com esta questão da prosperidade do ímpios. Sua inquietação é mais acentuada quando ele observa as atitudes que caracterizam a vida deles. Os ímpios são orgulhosos (v.6) e fazem questão de exibir seu orgulho como um “colar”(NTLH), são violentos (v.6), vivem maquinando planos perversos (v.7), oprimem seu próximo (v.8), blasfemam contra Deus (v.9), desafiam a Deus (v.11) e se não fosse o bastante “andam sempre despreocupados aumentando suas riquezas (v.12 NVI). Toda esta situação deixa não somente o salmista, mas qualquer cristão, no mínimo confuso, e no caso de salmista ele diz que “quase perdeu a confiança em Deus”(v.3 NTLH).
Os Efeitos na Vida do Salmista
Observar o contraste entre a vida dos ímpios e a sua própria vida, gerou um profundo sentimento de melancolia em Asafe, a ponto dele afirmar: “Parece que não adiantou nada eu me conservar puro e ter as mãos limpas do pecado, pois Tu, ó Deus, me tens feito sofrer o dia inteiro...” (v. 13-14 NTLH). É claro o sentimento de frustração nestes versos. Frustração causada por pensar que se manter puro ao lado de Deus foi em vão e que nenhuma recompensa terá.
No próprio texto lemos a expressão do desânimo de Asafe: “Quando tentei entender tudo isso, achei muito difícil para mim” (v.16 NVI). Todo raciocínio do poeta não foi suficiente para compreender toda aquela cena diante dele. Humanamente seria impossível explicar as causas desta aparente injustiça de Deus.
O Conforto do Salmista
Asafe desiste de tentar entender a vida sob a ótica humana, abandonou seu intento de achar a solução mediante o raciocínio, e entrou no santuário(v.17). Ele finalmente compreendeu que as verdadeiras dificuldades da vida só desaparecem na comunhão com Deus.
Algumas perguntas devem ser respondidas em relação ao santuário. A primeira é: quem o salmista encontrou no santuário? Em Hebreus 12:2 está escrito:
fitando os olhos em Jesus, autor e consumador da nossa fé, o qual, pelo gozo que lhe está proposto, suportou a cruz, desprezando a ignomínia, e está assentado à direita do trono de Deus.
Sim, o salmista encontrou Jesus. Somente compreendemos a vida plenamente quando encontramos o nosso Senhor e Salvador. Foi no momento do encontro com Jesus que as dúvidas e angústias de Asafe se desfizeram.
Quão privilegiados somos de poder entrar no santuário de Deus para encontrar a solução dos nossos problemas, mas precisamos ter plena consciência de que não são os nosso méritos que nos autorizam a entrar neste lugar tão sagrado. A bíblia nos explica como podemos ter este privilégio:
Tendo pois, irmãos, ousadia para entrarmos no santíssimo lugar, pelo sangue de Jesus, pelo caminho que ele nos inaugurou, caminho novo e vivo, através do véu, isto é, da sua carne (Heb. 10: 19-20)
É o próprio Jesus que abre o caminho para que o encontremos no santuário. Na condição que nos encontramos, se nos aproximássemos do santuário de Deus seríamos fuminados, mas Jesus nos cobre com o seu manto de Justiça e dessa forma podemos encontrá-lo no lugar santíssimo do santuário.
Após este encontro com Jesus, que é o motivo do retorno da tranquilidade do salmista, ele finalmente entende as coisas pela visão certa, a visão de Deus. A aparente prosperidade e felicidade dos ímpios é passageira e instável. Asafe percebe isto logo após encontrar-se com Jesus:
Certamente os pões em terreno escorregadio e os fazes cair na ruína. Como são destruídos de repente, completamente tomados de pavor! (Sal. 73:18-19 - NVI)
O comentário bíblico adventista fala assim:
Quando o salmista compreende o fim dos ímpios neste mundo e sua queda em meio da prosperidade, restabelece-se sua fé. Por perder o sentido de proporções, o salmista não pôde ver a retribuição que com freqüência sobrevém aos ímpios, até que entrou no santuário e se entregou plenamente em mãos de Deus. Tinha esquecido que Sodoma e Gomorra foram destruídas por fogo do céu, que a terra do Faraó tinha sido devastada pelas pragas e seus exércitos tinham perecido afogados no mar. (CBA- Versão Eletrônica, 428)
A verdadeira compreensão da vontade de Deus e de seus desígnios vieram ao autor bíblico somente quando ele se encontrava bem perto de Jesus, não havia mais incredulidade ou angústia, mas uma alegria plena vinda do trono de Deus.
Muito mais que compreender o destino dos ímpios, o salmista compreendeu o destino dos justos. Esse é o grande motivo de sua felicidade e ele expressa isso numa linda poesia no final do salmo:
Quando te lavantas , Senhor, tu não te lembras dos maus, pois eles são como um sonho que agente esquece quando acorda de manhã. O meu coração estava cheio de amargura, e eu fiquei revoltado. Eu não podia compreender, ó Deus; era como um animal, sem entendimento. No entanto estou sempre contigo e tu me seguras pela mão. Tu me guias com os teus conselhos e no fim me receberás com honras. No céu, eu só tenho a ti. E, se tenho a ti, que mais poderia querer na terra? Ainda que a minha mente e o meu corpo enfraqueçam, Deus é a minha força, ele é tudo o que sempre preciso. Os que se afastam de ti certamente morrerão, e tu destruirás os que são infiéis a ti. Mas, quanto a mim, como é bom estar perto de Deus! Faço do Senhor Deus o meu refúgio e anuncio tudo o que ele tem feito. (Sal 73:20-28 NTLH)
Asafe entendeu que embora os justos sofram nesta terra, eles terão um final glorioso e eterno ao lado de Jesus.
Que mensagem para os cristão do século XXI! Nesta vida há muito sofrimento para os que decidem estar sempre do lado de Jesus. Por outro lado, frequentemente vemos pessoas que não estão interessadas nas coisas celestiais e que até conscientemente fazem o que é errado perante Deus, mas apesar de tudo isso prosperam, tem saúde, famílias aparentemente felizes, casamentos sem grandes problemas, vida financeira estável.
Não há ninguém perfeito nesta terra, mas certamente existe um grupo que está buscando comunhão íntima com Deus e, assim como Asafe, ficam angustiados quando percebem que em sua vida não faltam tribulações, enquanto os ímpios ou mesmo aqueles que levam a religião displicentemente, parecem estar cada vez mais tranquilos em sua vida. Precisamos ter em mente a mensagem do salmo 73. Nosso final não é nessa terra, existe um final glorioso preparado para nós.
O apóstolo Paulo deixou registrado uma mensagem para o grupo dos justos:
Por isso não desfalecemos; mas ainda que o nosso homem exterior se esteja consumindo, o interior, contudo, se renova de dia em dia. Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós cada vez mais abundantemente um eterno peso de glória; não atentando nós nas coisas que se vêem, mas sim nas que se não vêem; porque as que se vêem são temporais, enquanto as que se não vêem são eternas. (II Cor. 4: 16 a 18)
É possível que cristãos fiéis passem por aflições neste mundo, mas em momento algum podemos perder o foco do soberano prêmio que nos está preparado.
A primeira visão da irmã White é um lindo relato do caminho do povo de Deus até o céu, ela conta:
Enquanto eu estava orando junto ao altar da família, o Espírito Santo me sobreveio, e pareceu-me estar subindo mais e mais alto da escura Terra. Voltei-me para ver o povo do advento no mundo, mas não o pude achar, quando uma voz me disse: "Olha novamente, e olha um pouco mais para cima." Com isto olhei mais para o alto e vi um caminho reto e estreito, levantado em lugar elevado do mundo. O povo do advento estava nesse caminho, a viajar para a cidade que se achava na sua extremidade mais afastada. Tinham uma luz brilhante colocada por trás deles no começo do caminho, a qual um anjo me disse ser o "clamor da meia-noite". Essa luz brilhava em toda extensão do caminho, e proporcionava claridade para seus pés, para que assim não tropeçassem. Se conservavam o olhar fixo em Jesus, que Se achava precisamente diante deles, guiando-os para a cidade, estavam seguros. Mas logo alguns ficaram cansados, e disseram que a cidade estava muito longe e esperavam nela ter entrado antes. (Primeiro Escritos, 14)
Depois de percorrer o longo caminho estreito sendo atacados pelos ímpios que odiavam este povo, ela continua descrevendo o que viu:
Logo nossos olhares foram dirigidos ao oriente, pois aparecera uma nuvenzinha aproximadamente do tamanho da metade da mão de homem, a qual todos nós soubemos ser o sinal do Filho do homem. Todos nós em silêncio solene olhávamos a nuvem que se aproximava e se tornava mais e mais clara e esplendente, até converter-se numa grande nuvem branca. A parte inferior tinha aparência de fogo; o arco-íris estava sobre a nuvem, enquanto em redor dela se achavam dez milhares de anjos, entoando um cântico agradabilíssimo; e sobre ela estava sentado o Filho do homem. (Idem, 16)
A visão continua e os salvos chegam no céu e são recebidos pelo próprio Jesus e seus anjos. No céu viram a árvore da vida e muitas outras maravilhas. Foi quando aconteceu um evento emocionante:
Todos nós fomos debaixo da árvore, e sentamo-nos para contemplar o encanto daquele lugar, quando os irmãos Fitch e Stockman, que tinham pregado o evangelho do reino, e a quem Deus depusera na sepultura para os salvar, se achegaram a nós e nos perguntaram o que acontecera enquanto eles haviam dormido. Tentamos lembrar nossas maiores provações, mas pareciam tão pequenas em comparação com o peso eterno de glória mui excelente que nos rodeava, que nada pudemos dizer-lhes, e todos exclamamos - "Aleluia! é muito fácil alcançar o Céu!" - e tocamos nossas gloriosas harpas e fizemos com que as arcadas do Céu reboassem. (Idem , 17 – Grifo suprido)
Este é o final dos justos. Um dia estaremos em um lugar tão maravilhoso perante o qual as tribulações deste mundo serão insignificantes. Era sobre isto que o apóstolo Paulo falava quando disse: “Pois tenho para mim que as aflições deste tempo presente não se podem comparar com a glória que em nós há de ser revelada (Rom. 8:18)”.
É preciso apenas resistir um pouco mais e logo estaremos no céu e finalmente as tribulações terão ficado para trás e tudo que existirá será felicidade ao lado daquele que foi, que é, e que será para todo o sempre, o nosso querido salvador: Jesus.
3 comentários:
Louvado seja Deus pela Sua Palavra. Que o Senhor continue o usando, Felippe, iluminando a sua mente para compreender as Sagradas Escrituras.
A certeza do que teremos ao lado de Cristo no céu, é o que nos mantem firmes por aqui. Muito bom o artigo Felippe. Que Deus o abençoe!
Felippe, parabéns pelo blog!
Ore por mim! abraços...
Postar um comentário